Para aliados, decisões que impediram Lula de ir a funeral reforçam "perseguição"
A série de decisões da Justiça, Ministério Público Federal e Polícia Federal que inviabilizaram nesta quarta-feira, 30, a ida do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao funeral de seu irmão Genivaldo Inácio da Silva, o Vavá, serviu de base para que aliados, familiares e o próprio Lula reforçassem o discurso de perseguição política.
“Não deixaram que eu me despedisse do Vavá por pura maldade”, disse Lula de manhã ao saber que a Justiça havia impedido a ida ao funeral. “Não posso fazer nada porque não me deixaram ir. O que eu posso fazer é ficar aqui e chorar”, lamentou o ex-presidente segundo relato da presidente do PT, Gleisi Hoffmann, à Agência PT de Notícias.
Vavá foi sepultado às 13h no cemitério da Paulicéia, em São Bernardo, onde também está enterrada a mãe de Lula, Eurídice Ferreira de Melo, a dona Lindu.
Lideranças petistas como Gleisi, os ex-ministros Gilberto Carvalho, Luiz Marinho e Aloizio Mercadante, os deputados Paulo Pimenta, Carlos Zarattini e Paulo Teixeira, companheiros das greves no ABC como Djalma Bom e Juno Rodrigues Silva, o Gigio, além dos filhos, irmãos e outros parentes de Lula acompanharam a cerimônia que teve gritos de “Lula Livre”.
Embora houvesse desde o início do dia a expectativa de o Supremo Tribunal Federal (STF) poder liberar a ida de Lula, em momento algum a família chegou a cogitar adiar o funeral.
A notícia de que o ministro Dias Toffoli havia autorizado que o corpo de Vavá fosse levado até uma base militar chegou quando o cortejo já havia saído da capela rumo ao túmulo onde o irmão do ex-presidente foi enterrado e só fez aumentar a indignação. No Twitter, as hashtags #LulaPresoPolitico e #Toffoli seguem na lista dos Trending Topics brasileiros, ou assuntos mais comentados do dia.
“É uma situação ridícula. Em todo país civilizado onde há democracia e até em zonas de conflito sempre se respeitou os mortos”, disse José Gomes da Silva, o Frei Chico, irmão mais velho e responsável por iniciar o ex-presidente na política sindical. “A verdade é que eles têm medo de Lula. Estão destruindo todo resquício de solidariedade humana no Brasil”, completou.
Em vídeo divulgado nas redes sociais, Frei Chico disse que Vavá morreu pedindo para ver Lula. Parentes lembraram que em 1980 o então líder sindical preso por comandar as históricas greves de metalúrgicos de 1978, 1979 e 1980 foi autorizado a visitar dona Lindu no hospital e comparecer ao funeral da mãe em plena ditadura militar.
“Já na dita democracia Lula foi impedido de ir ao enterro de Sigmaringa Seixas (advogado petista morto em dezembro) sob o argumento de que não havia parentesco e agora soltam a decisão durante o sepultamento. Fica cada vez mais claro que Lula é um preso político, um cidadão isolado na condição de refém do Estado”, disse Edson Inácio da Silva, filho de Vavá.
Os filhos de Lula presentes ao enterro rejeitaram de pronto as condições apresentadas pelo STF para que o ex-presidente visitasse a família ainda nesta quarta. Informados sobre a exigência de que o encontro fosse em uma base militar, disseram que estavam querendo levá-los para “o campo do inimigo”.
Lideranças petistas enxergaram nas exigências – que incluíam a proibição de celulares e da imprensa no local do encontro – sinais claros de que os responsáveis pela decisão não estavam preocupados com a segurança ou logística da operação mas. Na verdade, quiseram impedir imagens e declarações públicas do ex-presidente.
“Lula não pode ser visto nem ouvido. A decisão saiu no meio do sepultamento. Queriam o que? Que tirassem o corpo do túmulo? Isso é um escárnio”, disse o líder do PT na Câmara, Paulo Pimenta (PT-RS). “Lula saiu da condição de preso político para a de refém”, completou o deputado.
Para o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, a decisão de Toffoli, embora inócua do ponto de vista prático, serviu para mostrar que a juíza Carolina Lebbos, que proibiu a ida do ex-presidente ao velório com base em pareceres do MPF e da PF, violou um direito do ex-presidente.
“Se a juíza de primeira instância tivesse tido o bom senso do ministro Toffoli, Lula teria tido a oportunidade de se despedir do irmão”, disse ele.
Lebbos também foi alvo de críticas por parte de Gleisi, que lembrou decisões recentes tomadas pela juíza com o intuito de restringir a visita de líderes religiosos e advogados, entre eles o próprio integrante do partido, Fernando Haddad.
O principal alvo de críticas foi o ministro da Justiça, Sérgio Moro, responsável pela primeira condenação de Lula e chefe da PF.
“A juíza tinha que simplesmente despachar, mas não, consultou o MPF e a PF que é subordinada ao Moro. Em última instância ela, que é substituta do Moro, delegou a decisão ao próprio Moro”, disse Pimenta.
Em mensagem publicada nas redes sociais, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, candidato derrotado à presidência em 2018, disse que “sinceramente, entendo que a relação com Lula, que nunca foi jurídica, transbordou do político e se tornou pessoal”.
Desde que a defesa de Lula pediu autorização para que o ex-presidente fosse ao velório de Vavá, aliados do petista iniciaram gestões políticas para viabilizar o pedido que incluíram até adversários como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM). O vereador Eduardo Suplicy (PT-SP) chegou a mandar uma mensagem diretamente ao presidente Jair Bolsonaro (PSL).No início da noite, João Paulo Rodrigues, da coordenação nacional do Movimento dos Sem Terra, ligou para o vice-presidente da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o “Juruna”, que por sua vez acionou o deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP), amigo de Maia. As gestões, no entanto, não surtiram efeito.
O ex-jogador e atual comentarista Walter Casagrande Jr. rebateu o seu companheiro de Globo, Tiago Leifert. Em texto publicado na revista GQ nesta terça, 27, Casão defendeu que atletas se posicionem politicamente durantes eventos esportivos. Uma visão completamente contrária à exposta por Leifert, na mesma publicação, na última segunda-feira, 26.
Apesar de claramente contrariar o apresentador, o ex-atleta não o citou em nenhum momento em sua coluna. Casão mencionou que participou ativamente do movimento conhecido como “Democracia Corinthiana”, do qual era um dos líderes ao lado de Sócrates, no início da década de 80.
“Hoje, eu não poderia ter feito o que fiz? A manifestação do Corinthians em prol da democracia, assim como os Panteras Negras na Olimpíada de 1968, contribuíram para um mundo melhor”, escreveu Casagrande.
O comentarista, indiretamente, referiu-se ao deputado federal Jair Bolsonaro, que, provavelmente, concorrerá à Presidência nas eleições de outubro. Casão o criticou, sem citar seu nome, por ele apoiar a ditadura militar.
“Lamentar é a solução mais óbvia. Prefiro enfrentar com diálogo. Afinal, esta é a grande conquista da democracia. Foi por isso, para ter liberdade de pensar, falar, vestir-se como quiser, de ter o partido político que preferir e defender as bandeiras em que acreditar que lutamos durante 21 anos. Todas essas manifestações, desde que feitas dentro da lei, com respeito e valores, fazem parte de uma democracia madura”, pontuou Casagrande.
Então, o ex-jogador voltou a falar sobre esporte e política, defendendo que os dois assuntos se misturem. ‘Daí a importância do esporte como palco, sim, de discussões políticas. Por que os atletas deveriam se abster? A democracia dá o direito a donas de casa, cabeleireiros, taxistas, apresentadores de televisão e também a atletas profissionais de se manifestarem politicamente. Faz parte do jogo”, afirmou.
Para justificar sua opinião, Casão recordou o gesto dos americanos Tommie Smith e John Carlos, medalhistas na Olimpíada de 1968, na Cidade do México. Ao subirem no pódio, os velocistas ergueram os braços com os punhos cerrados, gesto característico de membros do Partido dos Panteras Negras, fundado em 1966, nos EUA.
“Mostraram o quão urgente era a discussão sobre o racismo”, avaliou o comentarista, que, também, citou o boxeador Muhammad Ali, morto em 2016. “[…] negou-se a combater no Vietnã justamente por saber o valor que a decisão de um ídolo do esporte teria em torno do debate da guerra[…]”.
Ao contrário de Leifert, Casão mostrou apoio aos atletas que se ajoelhavam durante a execução do hino americano em eventos esportivos, como jogos da NFL e da NBA. O ato era um prostesto contra a morte de negros em ações policiais. O comentarista ainda disse que quem é contra a manifestações de esportistas, possui “ideias reacionárias”.
“Quem proíbe o jogador de participar disso está, indiretamente, apoiando ideias reacionárias.E o caminho é inverso. Em um momento tão polarizado, extravasar isso é essencial. Só com o diálogo chegaremos a algum lugar. Espero que o esporte em geral continue exercendo sua função de servir de palco para ampliar as grandes discussões de um país, do mundo, para além da diversão. Viva a democracia”, finalizou.
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