Em sua primeira entrevista coletiva do segundo mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) descartou ontem a possibilidade de disputar o terceiro mandato em 2010. Lula deixou em aberto a hipótese de apoiar o governador tucano Aécio Neves (Minas Gerais) para o cargo, mas disse esperar que a base aliada do governo tenha candidato único na disputa presidencial, com a esperança de fazer o seu “sucessor” para o posto. “Não brinco com democracia. Fui obrigado a ser candidato à reeleição. Sou contra e não serei candidato em 2010. Não é por nada não, é porque a Constituição não permite.”
Lula defendeu a pluralidade de forças políticas que compõem o seu segundo mandato ao justificar a escolha de antigos críticos de seu governo para o primeiro escalão do Executivo – como o ministro Geddel Vieira Lima (Integração Nacional) e o filósofo Mangabeira Unger. O presidente acrescentou que “muita gente vai ter de engolir” o que disse sobre o seu governo com o passar do tempo.
Lula também negou que tenha reduzido o espaço do PT no primeiro escalão do governo, mesmo com a substituição de petistas para abrir espaço a partidos da base aliada. “O PT tem o privilégio de ter o cargo de presidente, o mais importante da República. Mais do que isso, é querer muita coisa”, enfatizou.
Sobre o segredo da sobrevivência política às investigações dos escândalos, como o mensalão e o caso Waldomiro Diniz, e os resultados positivos dos programas sociais que ele foi implementando ao longo do primeiro mandato, Lula disse que “tudo isso foi possível” porque “em nenhum momento permiti que qualquer sintoma da crise política adentrasse o Palácio do Planalto ou mexesse particularmente comigo. Quanto mais as coisas aconteciam, mais trabalhava”.
Na entrevista de duas horas, no Palácio do Planalto, o presidente lembrou que construiu a coalizão com todo o PMDB, e não com metade do partido, e voltou a agradecer o Congresso pelas votações, pedindo, agora, empenho dos parlamentares para a votação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), porque, “em sã consciência”, todo mundo sabe que nenhum governo pode viver sem essa contribuição. Lula aproveitou ainda para salientar a “boa relação” que mantém com os governadores, com quem pretende se reunir, novamente, no mês que vem e que considera naturais as reivindicações deles.
Lula lembrou que o que está propondo aos partidos “é construir uma coalizão neste País, que é diferente de distribuição de cargos”. Mas advertiu que “a ocupação dos cargos não pode ser condição sine qua non para a gente montar essa coalizão”.
Greve – Sobre o projeto elaborado pelo governo para regulamentar o direito de greve no País, o presidente disse que se sente à vontade, como ex-sindicalista, para propor a discussão do tema. “A greve no setor público não pode ser feita como em uma fábrica”, disse. O presidente negou que o objetivo do governo seja proibir o direito de greve no Brasil. Mas criticou os que abusam do direito sem efetivas razões trabalhistas.
“Não é possível que alguém faça greve 90 dias e receba os dias parados. Porque deixa de ser greve e passa a ser férias. Todos temos o direito de fazer greve, mas saber que não é tirar férias. Afinal de contas, você ganha pelo dia que você trabalha, e não pelo que fica em casa.”
Aborto – Sobre o aborto, ele disse que pessoalmente é contra. Mas que como chefe- de-Estado não pode se omitir sobre o assunto. “Tenho comportamento como cidadão, sou contra o aborto. E não acredito que tenha uma mulher neste País favorável ao aborto, como se fosse coisa que as pessoas querem fazer. Mas como chefe-de-Estado, sou a favor de o aborto ser tratado como saúde pública, dar atenção a pessoas que tiveram gravidez indesejada”, afirmou.